Ser Pensante

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"Todo homem honesto deveria tornar-se filósofo, sem se vangloriar em sê-lo." Voltairé

quinta-feira, 2 de julho de 2015

FARISAÍSMO: A RELIGIÃO DOS MILÊNIOS - PARTE III



PARTE III

    Apesar de o Evangelho Segundo São João dar pouca ênfase ao partido farisaico, cabe salientar que ele apresenta um fariseu de uma forma positiva, que reconhecia a importância de dar alguma atenção ao caráter da mensagem de Cristo. O presente fato se dá no capítulo três deste mesmo evangelho com a narrativa entre Cristo e Nicodemos. A narrativa não evidencia a reação final de Nicodemos às metáforas e figuras de linguagem utilizada por Cristo. Teria sido Nicodemos um fariseu diferenciado, pré-disposto a entender o paradoxo do cristo sob seu “nascer de novo”, frente à literalidade legalista oriunda de um movimento farisaico? Bem, a narrativa do capítulo sete deste mesmo Evangelho evidencia Nicodemos não sendo mais o questionador, mas o questionado pelos adeptos da seita que professava, por ter se prestado a ouvir Jesus. Nicodemos, de maneira como que socrática[1], contra argumenta aos fariseus, questionando a conduta de julgamento deles sobre quem cumpre ou não a Lei. A narrativa evidencia o ato dos fariseus tomarem como tolos os que simplesmente se prestavam a ouvir Jesus, por uma questão acima de tudo, relacionada à xenofobia e aos conflitos e preconceitos de cunho étnico entre os povos daquela região e tempo histórico. Por fim, o capítulo nove do Evangelho Segundo São João narra a maneira inquisitória como os fariseus abordam o cego curado por Jesus no sábado, deixando clara a preferência dos fariseus ao cumprimento da Lei do Sábado ante a cura de um homem que não podia enxergar. Temos aqui um cego sendo curado e homens de visão que continuam doentes e se enxergar. Todas estas narrativas serão abordadas com mais propriedade posteriormente.


    Sobre o Evangelho de São João, faz-se necessário ressaltar a total diferença literária quanto aos três que o antecedem e sua prerrogativa em apresentar a divindade de Cristo perante as possíveis influências helenísticas[2] sobre o autor e seu tempo histórico. O estilo de João é tão peculiar que o mesmo ganha o conceito de Quarto Evangelho, distinguindo-o dos chamados sinópticos, apontando-o como único e completamente distante por sua especificidade narrativa, relacionado à trindade que o antecede.


    Quanto à presença do farisaísmo nos demais livros do Novo Testamento e suas narrativas, temos poucas, mas relevantes passagens textuais, que muito contribuem para o primeiro passo frente o desenrolar destes textos, que se dão na compreensão do que ver a ser o movimento farisaico.


    No livro conhecido como Atos dos Apóstolos, onde é descrita a Era Apostólica[3], temos apenas três capítulos onde o farisaísmo é citado de alguma forma. Vale lembrar que a obra é tradicionalmente reconhecida como de autoria do apóstolo São Lucas, sendo a continuidade do Evangelho que leva o nome do mesmo autor, que como dissemos anteriormente, formavam um único livro.


    Lucas era adepto dos ensinamentos do apóstolo São Paulo, portanto, faz-se compreensível que o apóstolo seja o protagonista de boa parte das narrativas contida no livro de Atos. O primeiro texto a abordar o farisaísmo neste livro, está presente no capítulo quinze. Este capítulo narra a participação de São Paulo no Concílio de Jerusalém[4], onde o autor registra a presente tensão entre os primeiros cristãos que haviam acabado de sair do judaísmo e os gentios (cristãos que não eram judeus). A principal polêmica girava em trono da circuncisão[5], onde alguns entendiam que era necessária a manutenção da prática por parte dos que não eram judeus e estavam adentrando ao círculo dos que professavam a fé no Cristo e outros não. Neste Concílio, onde participaram também São Pedro São Tiago (o Justo), foi decidido que os gentios não precisariam se submeter às exigências da Lei de Mosaica. Pois bem, aqui está um texto essencial para compreendermos do que se tratava e qual era a postura do farisaísmo, também influente entre os primeiros cristãos conversos.
    Já havia sido observado no início destes textos, que a principal característica do movimento farisaico, era a forma veemente pela qual observavam a Lei Mosaica. No Concilio de Jerusalém, isto fica evidenciado por serem justamente os cristãos que haviam acabado de “romper” com o judaísmo e que ainda tinham alguma ligação com o farisaísmo praticado até então, a reivindicar que todos os gentios[6] fossem circuncidados, segundo a tradição da Lei Mosaica. O assunto rendeu grande discussão entre os apóstolos. São Pedro foi o primeiro a se opor aos que tinham ligação aos fariseus nesse sentido. Tiago, o segundo. Observem no presente texto que Paulo, que era fariseu de nascimento, não se pronuncia a respeito.


    A narrativa exposta no capítulo vinte e três do mesmo livro, traz a narrativa da prisão de São Paulo em Jerusalém. A principal acusação dos judeus sobre Paulo se dá justamente sobre ser ele um pregador dos não cumprimentos da Lei Mosaica. Outra acusação tida como grave ao apostolo São Paulo, foi a de ser um profanador do Templo, pelo fato de introduzir gregos ao mesmo. Paulo foi espancado por levar um grego ao Templo, segundo contavam seus acusadores. Paulo solicitou então falar aos seus irmãos judeus, em sua língua. Nos capítulo que antecedem a narrativa do capítulo vinte e três, Paulo não consegue dialogar de maneira pacífica com os judeus, mas consegue se livrar de uma punição maior ao lembrar aqueles iriam castigá-lo, de que era cidadão romano de nascimento.


    Diante do conselho que o ouvia afim de julgá-lo, isto já no capítulo vinte e três, estando São Paulo diante de judeus, tano fariseus quanto saduceus[7], teve a astúcia de fazer uso desta tensão jogando os fariseus contra seus rivais saduceus, ao se afirmar fariseus de nascimento, o que era verdade. Voltaremos nesta passagem posteriormente.


    Nos demais livros que compõem o Novo Testamento não há citação direta ao farisaísmo, com exceção ao capítulo três da carta de São Paulo aos Filipenses, onde o mesmo mais uma vez faz menção à sua origem farisaica. Aqui podemos entender um pouco das possíveis razões pelas quais Paulo, antes Saulo e fariseu, perseguiu, prendeu e matou tantos judeus conversos PA pregação dos apóstolos. O que é de extrema relevância é que São Paulo passará a exercer forte crítica ao legalismo característico dos partidos não oficiais da religião judaica que ainda era extremamente influentes entre o povo judeus em seus dias e também entre os primeiros judeus convertidos á fé cristã, tendo feito total diferença para a concepção de fé de rompimento com a religião dominante de sua região e nação, aparentemente. Veja bem, eu disse: aparentemente.







[1] Referência à “maiêutica”, método do filosofo grego Sócrates em fazer com que alguém alcance uma verdade objetiva, ou que perceba a ilusão sobre as verdes que está proferindo, por meio de perguntas.

[2] Referência ao período de grande expansão da cultura grega sobre outros povos, conhecido como Período Helenístico.
[3] Basicamente é o período de organização dos primeiros cristãos sob a sua prática de fé, desde a ascensão de Cristo até o Concílio de Niceia.

[4] Reunião entre os primeiros cristãos para decidir os rumos de sua fé no que dizia respeito ás práticas do judaísmo serem aplicadas também aos que não eram judeus e estavam se convertendo à fé cristã.

[5] Ritual de inclusão na comunidade judaica que consistia em uma cirurgia que retirava o prepúcio do órgão genital masculino.
[6] O que não era israelita e professava outra fé que não era a judaica.

[7] Partido não oficial dentro da religião judaica que rivalizava com os fariseus.

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