PARTE
III
Apesar
de o Evangelho Segundo São João dar pouca ênfase ao partido farisaico, cabe
salientar que ele apresenta um fariseu de uma forma positiva, que reconhecia a
importância de dar alguma atenção ao caráter da mensagem de Cristo. O presente
fato se dá no capítulo três deste mesmo evangelho com a narrativa entre Cristo
e Nicodemos. A narrativa não evidencia a reação final de Nicodemos às metáforas
e figuras de linguagem utilizada por Cristo. Teria sido Nicodemos um fariseu
diferenciado, pré-disposto a entender o paradoxo do cristo sob seu “nascer de
novo”, frente à literalidade legalista oriunda de um movimento farisaico? Bem,
a narrativa do capítulo sete deste mesmo Evangelho evidencia Nicodemos não
sendo mais o questionador, mas o questionado pelos adeptos da seita que
professava, por ter se prestado a ouvir Jesus. Nicodemos, de maneira como que
socrática[1], contra argumenta aos
fariseus, questionando a conduta de julgamento deles sobre quem cumpre ou não a
Lei. A narrativa evidencia o ato dos fariseus tomarem como tolos os que
simplesmente se prestavam a ouvir Jesus, por uma questão acima de tudo,
relacionada à xenofobia e aos conflitos e preconceitos de cunho étnico entre os
povos daquela região e tempo histórico. Por fim, o capítulo nove do Evangelho
Segundo São João narra a maneira inquisitória como os fariseus abordam o cego
curado por Jesus no sábado, deixando clara a preferência dos fariseus ao
cumprimento da Lei do Sábado ante a cura de um homem que não podia enxergar.
Temos aqui um cego sendo curado e homens de visão que continuam doentes e se
enxergar. Todas estas narrativas serão abordadas com mais propriedade
posteriormente.
Sobre o Evangelho de São João, faz-se
necessário ressaltar a total diferença literária quanto aos três que o
antecedem e sua prerrogativa em apresentar a divindade de Cristo perante as
possíveis influências helenísticas[2] sobre o autor e seu tempo
histórico. O estilo de João é tão peculiar que o mesmo ganha o conceito de
Quarto Evangelho, distinguindo-o dos chamados sinópticos, apontando-o como
único e completamente distante por sua especificidade narrativa, relacionado à
trindade que o antecede.
Quanto à presença do farisaísmo nos demais
livros do Novo Testamento e suas narrativas, temos poucas, mas relevantes
passagens textuais, que muito contribuem para o primeiro passo frente o
desenrolar destes textos, que se dão na compreensão do que ver a ser o movimento
farisaico.
No livro conhecido como Atos dos Apóstolos, onde é descrita a
Era Apostólica[3],
temos apenas três capítulos onde o farisaísmo é citado de alguma forma. Vale
lembrar que a obra é tradicionalmente reconhecida como de autoria do apóstolo São
Lucas, sendo a continuidade do Evangelho que leva o nome do mesmo autor, que
como dissemos anteriormente, formavam um único livro.
Lucas era adepto dos ensinamentos do
apóstolo São Paulo, portanto, faz-se compreensível que o apóstolo seja o
protagonista de boa parte das narrativas contida no livro de Atos. O primeiro
texto a abordar o farisaísmo neste livro, está presente no capítulo quinze.
Este capítulo narra a participação de São Paulo no Concílio de Jerusalém[4], onde o autor registra a
presente tensão entre os primeiros cristãos que haviam acabado de sair do
judaísmo e os gentios (cristãos que não eram judeus). A principal polêmica
girava em trono da circuncisão[5], onde alguns entendiam que
era necessária a manutenção da prática por parte dos que não eram judeus e
estavam adentrando ao círculo dos que professavam a fé no Cristo e outros não.
Neste Concílio, onde participaram também São Pedro São Tiago (o Justo), foi
decidido que os gentios não precisariam se submeter às exigências da Lei de
Mosaica. Pois bem, aqui está um texto essencial para compreendermos do que se
tratava e qual era a postura do farisaísmo, também influente entre os primeiros
cristãos conversos.
Já havia sido observado no início destes
textos, que a principal característica do movimento farisaico, era a forma
veemente pela qual observavam a Lei Mosaica. No Concilio de Jerusalém, isto
fica evidenciado por serem justamente os cristãos que haviam acabado de
“romper” com o judaísmo e que ainda tinham alguma ligação com o farisaísmo
praticado até então, a reivindicar que todos os gentios[6] fossem circuncidados,
segundo a tradição da Lei Mosaica. O assunto rendeu grande discussão entre os
apóstolos. São Pedro foi o primeiro a se opor aos que tinham ligação aos
fariseus nesse sentido. Tiago, o segundo. Observem no presente texto que Paulo,
que era fariseu de nascimento, não se pronuncia a respeito.
A narrativa exposta no capítulo vinte e
três do mesmo livro, traz a narrativa da prisão de São Paulo em Jerusalém. A
principal acusação dos judeus sobre Paulo se dá justamente sobre ser ele um
pregador dos não cumprimentos da Lei Mosaica. Outra acusação tida como grave ao
apostolo São Paulo, foi a de ser um profanador do Templo, pelo fato de
introduzir gregos ao mesmo. Paulo foi espancado por levar um grego ao Templo,
segundo contavam seus acusadores. Paulo solicitou então falar aos seus irmãos
judeus, em sua língua. Nos capítulo que antecedem a narrativa do capítulo vinte
e três, Paulo não consegue dialogar de maneira pacífica com os judeus, mas
consegue se livrar de uma punição maior ao lembrar aqueles iriam castigá-lo, de
que era cidadão romano de nascimento.
Diante do conselho que o ouvia afim de
julgá-lo, isto já no capítulo vinte e três, estando São Paulo diante de judeus,
tano fariseus quanto saduceus[7], teve a astúcia de fazer
uso desta tensão jogando os fariseus contra seus rivais saduceus, ao se afirmar
fariseus de nascimento, o que era verdade. Voltaremos nesta passagem
posteriormente.
Nos demais livros que compõem o Novo Testamento
não há citação direta ao farisaísmo, com exceção ao capítulo três da carta de São Paulo aos Filipenses, onde o mesmo
mais uma vez faz menção à sua origem farisaica. Aqui podemos entender um pouco
das possíveis razões pelas quais Paulo, antes Saulo e fariseu, perseguiu,
prendeu e matou tantos judeus conversos PA pregação dos apóstolos. O que é de extrema
relevância é que São Paulo passará a exercer forte crítica ao legalismo característico
dos partidos não oficiais da religião judaica que ainda era extremamente influentes
entre o povo judeus em seus dias e também entre os primeiros judeus convertidos
á fé cristã, tendo feito total diferença para a concepção de fé de rompimento com
a religião dominante de sua região e nação, aparentemente. Veja bem, eu disse: aparentemente.
[1]
Referência à “maiêutica”, método do filosofo grego Sócrates em fazer com que
alguém alcance uma verdade objetiva, ou que perceba a ilusão sobre as verdes
que está proferindo, por meio de perguntas.
[2]
Referência ao período de grande expansão da cultura grega sobre outros povos,
conhecido como Período Helenístico.
[3]
Basicamente é o período de organização dos primeiros cristãos sob a sua prática
de fé, desde a ascensão de Cristo até o Concílio de Niceia.
[4]
Reunião entre os primeiros cristãos para decidir os rumos de sua fé no que
dizia respeito ás práticas do judaísmo serem aplicadas também aos que não eram
judeus e estavam se convertendo à fé cristã.
[5]
Ritual de inclusão na comunidade judaica que consistia em uma cirurgia que
retirava o prepúcio do órgão genital masculino.
[6] O
que não era israelita e professava outra fé que não era a judaica.
[7]
Partido não oficial dentro da religião judaica que rivalizava com os fariseus.
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