Ser Pensante

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"Todo homem honesto deveria tornar-se filósofo, sem se vangloriar em sê-lo." Voltairé

terça-feira, 30 de junho de 2015

Sábio infantilizado



Por que criamos imagens idealizadas sobre as pessoas?

Por que nos surpreendemos negativamente, ao conhecer aquele cara que admiramos pela sabedoria, ao ver que ele não tem uma idade avançada, uma barba grande, uma voz suave e delicada, um português coloquial costumeiro, um currículo acadêmico de sucesso, uma posição de destaque na hierarquia do social?

Por que não imaginamos a sabedoria com simplicidade?

Por que um sábio não pode ter o aspecto e um jovem, que ri, que fala palavrão, que bebe uma boa cerveja, que não quer ser o dono da razão e ter a última palavra, que não vai arrebatar multidões com um tom agressivo e de total segurança em suas palavras, que pressupõe sempre a dúvida antes das certezas, que não amam a posição e o privilégio de qualquer liderança ou institucionalidade?

É porque em cada um de nós, em alguma medida, a começar em mim, habita o espírito legalista do farisaísmo.

Só o espírito de uma criança pode pressupor e indagar:

“Por que todo o porque tem um porquê?”

Os gregos desenharam os sábios de larga idade e de barba e cabelos brancos.

Os evangelhos me apresentaram um Jesus adolescente ensinando aos doutores do templo e, quando adulto, exaltando as crianças em detrimento a estagnação espiritual dos adultos.

Quando leio os evangelhos não vejo o Cristo velho, de barba e autoritário que me apresentam.

Vejo o Cristo de doze anos, promovendo um nó na cabeça dos grandes sábios de sua época.

Com Cristo aprendi a buscar a sabedoria simples nos lugares certos, do jeito mais simples que pode existir.

Ela está entre as crianças.

Os pequeninos de todo o tipo carregam em si o que há de mais belo no homem: a dúvida.

Você dificilmente vê uma criança falando: eu vou te ensinar sobre isso.

As crianças querem aprender e compartilhar o que aprenderam, ou as histórias que criam.

Com razão, sai da boca delas o perfeito louvor.

Vamos agora ler e ouvir apenas crianças? Claro que não.

Vamos nos tronar como elas, e julgar menos as aparências, depositando a nossa observação e curiosidade, intrínseca á todo ser humano, sobre todos, sem a mania de pré conceituar que a sociedade nos oferece ao longo dos séculos.

O que torna um homem mais velho sábio é a sua capacidade ver sabedoria nos mais jovens.

Se ele for velho e não tiver essa capacidade, será apenas velho, e não sábio.

Eu avisei: bem vindo ao constrangimento.

domingo, 28 de junho de 2015

FARISAÍSMO: A RELIGIÃO DOS MILÊNIOS - PARTE II

PARTE II



    Ao tratarmos das características do movimento farisaico, a principal fonte de informação sobre o mesmo, sem dúvida alguma, é a coleção de textos, livros, cartas e epístolas, que tem como intento o registro e disseminação, tanto da história do povo judeu como de uma das principais figuras de extrema relevância para a compreensão da história das sociedades: falamos aqui da Bíblia e de Jesus Cristo. Sendo assim, é importante observarmos alguns aspectos literários que darão melhor visibilidade ao que há de mais relevante sobre o farisaísmo em tal acervo, tomando-o, antes de tudo, como textos de caráter narrativo e documental, o que nos propiciará ampla visualidade ao que há de mais relevante sobre o farisaísmo.

    O livro que dá início ao que conhecemos como Novo Testamento, o Evangelho Segundo São Mateus, dá especial atenção ao movimento farisaico nos dias de Cristo. A presença dos fariseus nas narrativas desta obra é constante, como em nenhum outro livro. Há uma importante justificativa para tal. Segundo o historiador Jonathan Hill, especialista em História do cristianismo, o Evangelho Segundo São Mateus foi elaborado em uma época de separação definitiva entre os que se identificavam como cristão (os chamados judeu-cristãos) à religião judaica. Em relação entre os dois grupos estava em sua pior fase[1]. O Evangelho de São Mateus tem um intuito claro de legitimar a figura messiânica do Cristo enquanto cumpridor das profecias da tradição judaica. O Evangelho de São Mateus tem sido desde os primórdios das organizações dos textos canônicos e uso por parte das igrejas Católica e Protestante, impresso em primeiro lugar nas obras que formam o Novo Testamento. Isto porque, segundo Santo Agostinho[2], este Evangelho teria sido escrito entre 50 e 75, mas na atualidade, não são poucos os pesquisadores que apontam o Evangelho Segundo São Marcos como o mais antigo dentre os do cânone neotestamentário. Muitos pesquisadores a partir do século XVIII passaram a questionar a autoria da obra ao discípulo de Cristo, conhecido como Mateus, o cobrador de impostos, ou como apontado nos textos bíblicos, o publicano. Os que assim creem, reivindicam a autoria desta obra a um possível judeu-cristão anônimo. Os estudiosos mais conservadores sobre esta questão atribuem a Mateus, o discípulo, tal autoria.

    Os dois caminhos possíveis sobre o autor da obra em evidencia nos levam à uma imprescindível reflexão sobre o farisaísmo, tendo em vista que, se de fato a obra que mais aponta críticas sobre a seita judaica foi escrita por um judeu cristão, em processo histórico de rompimento com a tradição religiosa judaica, é mais do que natural que o autor tenha se firmado sobre o fim da necessidade e do cumprimento da Lei mosaica[3], sob a necessidade de se entender a proposta do Cristo como cumpridora desta lei. Parece compreensível então o uso do anonimato por parte do autor, tendo em vista o teor violento e extremista da facção judaica tratada aqui, sob a ótica do legalismo ante a tradição. Se de fato a obra foi escrita por Mateus que era  um publicano, está aqui uma grande ironia sobre o movimento farisaico e sobre qualquer radicalismo diante da possibilidade de arrependimento por parte de alguém que a principio viria a oprimir os seus, fazendo-se contraditório frente os ensinamentos do Cristo. Compreensão esta que fica evidente na narrativa do Evangelho de São Lucas sobre a parábola O Fariseu e o Publicano, em uma sequência de instruções e questionamentos levantados por Cristo aos seus discípulos narrados também de maneira sequencial neste Evangelho. Talvez a obra e o texto, tido como um dos principais e a meu ver o principal quando o assunto é farisaísmo, tenham para além do caráter denuncista sobre a seita judaica, o intento de advogar sobre os que eram acusados pelos adeptos destas seitas e até mesmo por parte dos legítimos seguidores de Cristo, como no caso de Mateus por ser um publicano. Mas isto será abordado com mais propriedade posteriormente.

    O Evangelho Segundo São Marcos, que é apontado pela maioria dos estudiosos como o primeiro dos Evangelhos a ser produzido, denota um misto de características positivas e negativas segundo os fariseus.[4] Este Evangelho apresenta uma certa subtileza sobre as críticas estabelecidas sobre os movimentos de raiz judaizante que se opunham a Cristo, se comparado ás narrativas dos outros dois evangelhos sinópticos[5]. O fato de ser o evangelho mais curto, contendo apenas dezesseis capítulos, somados com a atenção especial à relevância que esta obra contempla frente os milagres do cristo e seus diversos pedidos de silêncio aos que eram beneficiados por tais prodígios, são traços fortes que marcam esta obra. Outro traço reconhecido por alguns estudiosos sobre os textos de São Marcos está no fato de que muitos o reconhecem como uma obra destinada a apresentar Jesus aos chamados gentios[6] de língua grega e que estavam inseridos sobre os domínios  geográficos, políticos e culturais do Império Romano. Logo, faz-se compreensível que o autor da obra (não há unanimidade sobre a identidade do autor entre os estudiosos) não tenha se preocupado muito em retratar os possíveis problemas de Jesus com o judaísmo de sua época, mas sim a maneira como Jesus se relacionava com os que estavam necessitados em conhecer a sua postura e seu possível messianismo. O diferencial do Evangelho de São Marcos, neste sentido, é que o autor não apresenta uma teologia impositiva em afirmar o messianismo de Cristo, postulando então o conceito de “Segredo Messiânico” sobre muitas das suas narrativas. Esta última caracteriza merece especial atenção e será abordada posteriormente quando tratarmos do farisaísmo e da apropriação do termo para os nossos dias. É necessário observar também que a obra de São Marcos é tida por muitos como uma obra de caráter pacificador quanto ao messianismo de Cristo relacionado à problemática frente este conceito entre judeus e os judeus rompantes que seguiam o Cristo.

    O Evangelho Segundo São Lucas apresenta grande erudição e evidencia enorme talento literário. O uso do grego, língua predominante na época tal qual o inglês e sua universalidade imperial em nossos dias, evidencia uma preocupação do autor quanto ao alcance aos não judeus (os chamados gentios que agora se tornavam cristãos), ­ ainda maior que a do autor da obra do Evangelho de São Marcos.

    O livro de São Lucas denota um período chamado de meio tempo em suas narrativas. Isto se dá por conta do entendimento de que o livro dos Atos dos Apóstolos teria sido escrito pelo mesmo autor e os dois na verdade implicariam em uma única obra, dividida em dois volumes. Nesse sentido, o capítulo primeiro deste evangelho traria o primeiro período, que vai desde a história que antecede o surgimento de João Batista e se finda no batismo de multidões por meio do próprio João e do seu apontamento para a vinda do Messias, dando assim início ao segundo período, este período do meio que acabo de evidenciar, que vai até o final da obra deste evangelho, visando apresentar a vida e mensagem do Cristo. O terceiro período se dá no livro dos Atos dos Apóstolos, onde Lucas se propõe a narrar a história da primeira Igreja, conhecida como Igreja Primitiva e o surgimento e influência do apóstolo Paulo sobre a mesma. O segundo período conceituado como meio tempo é de fundamental importância para entendermos a forma como Cristo é apresentado pelo autor e, consequentemente, a forma como este Cristo se relaciona com o mundo a sua volta e, claro, com o movimento farisaico.

     Este segundo período aqui observado, parece revelar uma preocupação que os cristãos da época da produção da obra tinham com relação ao iminente retorno do Cristo. Sendo assim, Lucas irá centrar-se sobre a natureza do reino e da vida comunitária da Igreja como consequência da compreensão desta natureza aplicada à vida prática. Um bom exemplo disto está no fato de que apenas o Evangelho de São Lucas contém as tão populares parábolas do Filho pródigo, do Mordomo Infiel e do Bom Samaritano. Neste sentido podemos afirmar que o autor da obra parece querer oferecer um caráter filosófico, um norte sob a vida e a mensagem do Cristo e do que deveria ser a mesma aplicada pela Primeira Igreja. A obra ainda denota especial cuidado para com a humanidade e o caráter cuidadoso de Deus para com os pobres, as crianças e as mulheres. Vale ressaltar também o importante papel que o autor deste Evangelho dá à participação das mulheres na atuação de Cristo. Em suma, o Evangelho de São Lucas é o que apresenta um Cristo preocupado em resumir a Lei no “amar a Deus sobre todas as coisas e ao teu próximo como a ti mesmo”, resplandecendo um Cristo longínquo com relação ao poder e aos que afirmam deter o poder e o aproximando de todo o que é tido pelo constructo social como fraco ou que venha a se reconhecer como tal. Aqui temos um relato mais do que especial para o desenvolvimento de nossa narrativa: a parábola sobre o fariseu e o publicano. Confesso ter especial empatia pela obra, pelo cuidado historiográfico e pelo caráter filosófico que marca os traços do autor, ainda que seja da opinião de muitos que tal homem seja desconhecido, o que faz da obra ainda mais especial, já que sou um legítimo amante do heroísmo incógnito.

    No que tange ás citações de Lucas aos fariseus, o capítulo sete deste Evangelho é um verdadeiro tratado moral e ético de Cristo frente aos amantes da perfeição legalista de seus dias. O capítulo onze evidencia um caráter crítico de Cristo aos religiosos de seus dias por não se mostrarem abertos à simplicidade de sua mensagem, dando sequência a narrativa em que Jesus aceita jantar com um fariseu em sua casa. O capítulo dezesseis deste Evangelho também pretende ser de alto teor crítico-moral aos legalistas que pareciam ter uma paixão acima da própria Lei que tanto reivindicavam, sendo esta paixão o dinheiro. E, por fim, temos o capítulo dezoito do Evangelho de São Lucas com a já conhecida e citada aqui anteriormente, parábola que narra a história do encontro de um fariseu com um cobrador de impostos. Todos estes capítulos serão tratados de especial forma nos textos subsequentes desta obra.




[1] HILL, Jonathan. História do Cristianismo, p.38
[2] Conhecido também como Agostinho de Hipona, foi um dos mais importantes teólogos e filósofos do início e da história do cristianismo.
[3] Código de leis da religião judaica que  organizavam o comportamento sobre a tradição de seu povo e adeptos de tal fé.
[4] HILL, Jonathan. História do Cristianismo, p.38
[5] Os livros de Mateus, Marcos e Lucas compõem estes Evangelhos.
[6] Termo que faz referencia a um individuo que não é judeu.

domingo, 21 de junho de 2015

FARISAÍSMO: A RELIGIÃO DOS MILÊNIOS - PARTE I



PARTE I


     Para compreender o versar da seguinte obra é preciso, antes de tudo,  lançar-se sobre o cálice do poético e embebedar-se sobre a ode de muitas das propostas e conceitos aqui tomados, fazendo uso da significação destes, mas sem o apego literal costumeiro de nosso objeto de estudo, reflexão e crítica: o farisaísmo. Sendo assim, caminharemos sobre a prancha do conceito de religião sem o medo de cairmos ao mar do não literal, e sem um vasto debate em torno do que seria religião, como elucidou Voltaire[1] quando fez referência às discussões levantadas entre os doutos que convergiam das opiniões do bispo de Gloucester sobre o conceito de religião e aquilo que se aplicava a ele, quando defendia o bispo:



“Uma religião, uma sociedade que não está fundada na crença em outra vida, deve ser sustentada por uma providência extraordinária. O judaísmo não está fundado sobre a crença de outra vida; portanto, o judaísmo foi sustentado por uma providência extraordinária.”[2]
    
    


    Em contra partida, o bispo recebia a seguinte crítica:



“Toda religião que não estiver baseada sobre o dogma da imortalidade da alma e nas penas e recompensas eternas é necessariamente falsa; ora, o judaísmo não conheceu esses dogmas; logo, o judaísmo, longe de ser sustentado pela Providência, era, segundo teus princípios, uma religião falsa e bárbara que atacava a Providência.” [3]
       


    A constatação que este título propõe sobre o farisaísmo como a religião dos milênios não deve pressupor a literalidade do termo religião sobre a origem etimológica do mesmo.[4] Se existe a necessidade de que tomemos um norte para a conceituação de religião sobre o farisaísmo, que seja dado sobre as  formas a seguir. Uma delas pode ser elucidada da perspectiva do próprio Voltaire sobre religião e suas justificativas sobre tal explanação, trazendo à discussão a essência das sociedades em estabelecer um deus para receber adoração e prestação de serviço dos seres humanos, ou de respostas aos anseios desta vida sobre a esperança de outra, de algo para além do que podemos contemplar sobre o nosso respirar que ofereça sentido a ele. Tomemos aqui então exatamente esta necessidade, que vem de encontro com uma ânsia em se estabelecer padrões, ritos, normas e hierarquias a serem cumpridas, estabelecendo assim uma moral e ética própria ao grupo que se identifica com os pressupostos, que transcenda o espaço do religioso até as mais densas camadas sociais e suas organizações.


     No sentido de ligar algo, culminado a influenciar os mais variados círculos sociais, está esse instinto que tomarei aqui por religioso. Mas, por que entendê-lo enquanto pressuposto presente em milênios? Isto é o que iremos desenvolver ao longo desta narrativa. Para tanto, vamos ao imo da questão: a origem, etimológica e histórica, do termo farisaísmo. Isto exigirá uma boa dose de paciência  sobre o início minucioso deste trabalho.



     O farisaísmo é apontado por diversos pesquisadores como uma espécie de seita (no que diz respeito ao seu caráter religioso) e uma espécie de “partido não oficial” (no que tange à sua participação política entre a sociedade judaica). Esse segmento do judaísmo estava em ascensão nos dias de Cristo e por isso encontramos diversos textos nos evangelhos sinópticos que visam dar registro e relevância à participação dos mesmos no âmago da sociedade contemporânea ao Cristo, e sua disputa na ocupação do espaço político- ideológico, tanto com o homem que viria a tornar-se o principal nome de sua era, como com os demais movimentos concorrentes, que serão apresentados mais adiante.



     A origem dos fariseus, enquanto movimento de caráter organizado sobre as bases evidenciadas acima, ainda é assunto que gera grande divergência entre os pesquisadores do tema, tornando-se difícil estabelecer com precisão sua data natalina e a origem etimológica do termo que o nomeia. Muitos afirmam que o movimento era originário dos hassidim (os piedosos), grupo que se tornou conhecido por apoiar a revolta dos macabeus[5], lutando contra a anexação e influência da cultura grega (helenismo) sobre o judaísmo, reivindicando um purismo dentro da religião e da sociedade judaica. Há de se levar em consideração aqui os duros embates da sociedade judaica com os impérios dominantes ao longo da Antiguidade e a recém conquista do Reino de Judá, por volta de 587 a.C.  por conta dos babilônios, gerando uma grande dispersão do povo judeu e, consequentemente, promovendo o levante de diversos grupos frente a organização política (e aqui cabe mais uma vez acentuar que esta se dava na luta pela liberdade frente o Império opressor), e cultural (âmbito da tradição sobre o impulso do religiosos), da sociedade judaica. Os fariseus passam a ocupar uma posição central e de justo destaque nesse âmbito, principalmente por conta de terem sido responsáveis pela institucionalização das sinagogas, que vieram a suprir a necessidade dos templos, onde as mesmas tomam um caráter religioso no sentido mais estrito da palavra, funcionando como um ponto de encontro que daria condições de um “re-ligar” do disperso povo judeu.  Apesar de terem popularizado a instituição das sinagogas, os fariseus não há tomavam como algo sacro e indispensável para o desenvolvimento e organização dos ritos e reflexões da religião judaica, e em muitas ocasiões reuniam-se em casas de caráter privado, fazendo destas a sua sinagoga. Este ponto merece grande destaque e será trazido à tona posteriormente.



     A origem do termo, como já apontado aqui, é tão difícil de precisar quanto sua data de inicio enquanto movimento organizado. Segundo Ruben Aguilar[6], a palavra fariseu parece derivar tanto do termo hebraico poresh, que tem o sentido de “expor”, “apresentar”, como do termo paras, que exprime o sentido de “separar”.  É dessa raiz etimológica que se origina o termo perashim , que tem um som mais próximo ao grego pharisaicos , que dá constatação de “um que é separado da multidão profana”. Note aqui a importância de retomarmos o contexto histórico em que tal via do judaísmo surge e seu entrave frente uma possível inserção de valores culturais externos sobre o povo judeu. Está muito próxima da unanimidade a ideia de que os fariseus se auto intitulavam como “santos”, “puros” e juntos formavam a “verdadeira comunidade judaica de Israel”. Já podemos trilhar aqui o que viria a ser o  espírito farisaico posto[7] sobre nossa sociedade ao longo dos milênios e, sem dúvida alguma, dar início à reflexão do domínio da prerrogativa ortodoxa farisaica sobre a égide das organizações e convenções sociais, tanto históricas quanto do contemporâneo.











[1] Aqui tratamos mais uma vez da obra “Dicionário Filosófico”, considerada um clássico da filosofia e extremamente influente para o desenvolvimento do pensamento iluminista no século XVIII, que aparecerá de maneira constante neste tratado.

[2] Aqui Voltaire cita o bispo de Gloucester em sua obra “Divina Legação de Moisés demonstrada”.

[3] Aqui Voltaire exprime o pensamento dos que discordavam do pressuposto religioso evidenciado pelo bispo de Gloucester, observando o aspecto explanado sobre o mesmo com base também no judaísmo.

[4] Do latim Religare, que re-liga.

[5] Os macabeus formaram uma frente de resistência armada entre o povo judeu, que reivindicava a independência da Judéia com relação a dominação da cultura e política helenística sobre a região.

[6] A obra “Inimigos do cristianismo primitivo como tipo escatológico”, será usada de maneira constante neste trabalho.

[7] Tomo emprestado aqui o conceito de espírito que Weber aplica em sua obra “A ética protestante e o espírito do capitalismo”.




Se você perdeu a Introdução ao tema, pode ler em: FARISAÍSMO: A RELIGIÃO DOS MILÊNIOS - INTRODUÇÃO   


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domingo, 14 de junho de 2015

FARISAÍSMO: A RELIGIÃO DOS MILÊNIOS



INTRODUÇÃO



      A segunda década do século XXI pode estar evidenciando características de uma época própria, única, marcada por movimentos de ruptura política, cultural e econômica em larga escala, proporcionando aos historiadores, sociólogos e antropólogos do amanhã, um magno objeto de pesquisa para a compressão dos seus dias, que a nós parece que se darão de forma conturbada. Em suma, somos o ponto de mutação[1] do amanhã.

      O momento atual é, para muitos, o ápice da história da humanidade enquanto sociedade organizada política e culturalmente falando, principalmente pelo acesso que temos hoje às fontes de informação e facilidade em difundir as mesmas. Tomemos aqui o seguinte exemplo comparativo: se no século XVIII, Voltaire pôde concluir sua obra “Dicionário Filosófico” (uma espécie de Wikipédia comentada de seus dias), em espaço de tempo de meses ou até anos[2], podemos supor que se o mesmo autor se propusesse a escrever a mesma obra hoje, com certeza o produto final seria muito mais complexo em informações e dados históricos, tendo o autor maior facilidade ao buscar fontes de informação para o desenvolvimento de seu trabalho, além de poder disseminar suas idéias e provocações por todo o mundo, sem ter de depender da aprovação, incentivo ou patrocínio de qualquer rei, instituição religiosa, Estado ou editora para tal, desde que o mesmo tivesse uma conta no Twitter, uma página no Facebook ou um blog pessoal, o que pode evidenciar que qualquer um de nós possa ser o Voltaire de nossa era, contribuindo por meio da disseminação de idéias, à eclosão de qualquer revolução, em qualquer esfera. E muitos assim de fato se vêem.

         Segundo o IBGE, mais de 85 milhões de brasileiros nadaram sob as águas do virtual em 2013, o que em cinco anos representou um aumento extremamente significativo de mais de 50% de mergulhadores em atividade constante. Vale lembrar que exatamente no ano de 2013, as ruas das principais capitais brasileiras foram tomadas por diversos movimentos populares, com um número de reivindicações em suas pautas tão grande quanto o número dos que saíram às ruas, que se organizaram e disseminaram seus ideais por meio do ciberespaço.

     À luz destas observações, cabe a reflexão sobre nossa postura enquanto agentes protagonistas do presente tempo histórico, onde somos formados e formamos as tão expressivas opiniões. Temos anseio em expressá-las, pois arduamente adquirimos tal direito e, conseqüentemente, visaremos o lucro do reconhecimento de nosso trabalho em expor tais pressupostos coerentes por meio dos comentários, curtidas e compartilhamentos que evidenciam quem são nossos comuns e, por conseqüência, a unidade contra o incoerente e leviano réu: o inimigo comum.

     A presente era da Mãe Polêmica e das irmãs Rupturas no que tange ao todo do social, tem como carro chefe a religião e sua histórica influência sobre o complexo de complexos do social. E é exatamente aqui que encontramos o cerne daquilo que iremos desenvolver nestas próximas leituras. É aqui que surge o termo farisaísmo.

     O termo fariseu tem aparecido de maneira constante em polêmicas que concernem ao espaço religioso e tem sido atribuído principalmente aos que se reconhecem como propagadores de uma volta dos que não foram, de um retorno que se faz urgente à uma moral que acreditam ser a ideal sob o aspecto da  vivência do social, que defendem e classificam sobre o epíteto de “bons costumes”, que ao que parece à alguns não passam de pilares da tradição que nunca deixaram de sustentar a casa de maneira ineficaz, o que faz com que os que discordam desta reivindicação denunciem essa postura paradoxal como farisaica. Sendo assim, faz-se necessária uma reflexão sobre o conceito de fariseu. O que viria a ser este termo que outorgamos a alguém? Seríamos dignos dele também? Há um fariseu “farinha do mesmo saco”, que leva as crianças que fomos um dia a crescerem e se tornarem adeptos do farisaísmo, em cada um de nós?

     Nessa seqüência de textos sobre a presente temática, gostaria de convidá-lo a me acompanhar  nesta relevante busca, onde diversas obras, textos e autores nos darão um belo meio de transporte para uma viagem às origens, histórico da aplicação do termo e apropriação cultural deste ao longos dos tempos, de maneira exaustiva, mas de forma farisaicamente prazerosa.

     No mais, bem vindo ao constrangimento.

  










[1] Conceito tomado por referência ao livro “O ponto de mutação”, de  Fritjof Capra, publicado em 1983, que deu origem ao filme de mesmo título, dirigido por Bernt Amadeus Capra, em 1990.

[2] A mesma obra foi impressa no Brasil, em 2008 pela editora Escala, com 480 páginas.