Ser Pensante

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"Todo homem honesto deveria tornar-se filósofo, sem se vangloriar em sê-lo." Voltairé

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

O chaveiro da Casa sem portas - Parte 10




Vincent costumava prestar a atenção suficiente nas aulas ministradas em sua escola, com a finalidade de ter em mente o básico para sua aprovação ao término do ano letivo. Sempre que podia, acabava por arrumar algum tempo, no meio das aulas, para prosear com seus colegas de classe. A sua frente costumava sentar-se Ivan. À sua direita, Rômulo. À esquerda, William. E a única garota pertencente ao quarteto filosófico do “meio de aula” era Sofia. Os amigos eram diferentes em diversos aspectos, mas muito semelhantes na maioria deles. Vincent era tímido ao extremo para com garotas, e dificilmente se dirigia à Sofia para pedir algum conselho frente seus inúmeros pensamentos. Geralmente interagia com a garota apenas rindo das colocações engraçadas da jovem em assuntos sobre o cotidiano. Sofia gostava de ser sarcástica, e sabia que isso lhe dava alguma notoriedade entre os garotos. Por sinal, ela tentava de todo o jeito que as garotas fizessem uso do mesmo sarcasmo para com os companheiros de classe, a fim de valorizar a participação feminina nos diálogos mais importantes.

— William. William.

— Diga Rômulo.

— Tens percebido o quanto Vincent está pensativo nos últimos tempos?

— Ora Rômulo, Vincent sempre foi assim. Nunca foi de falar demais e, quando fala, geralmente é para expor suas dúvidas com relação à vida.

— Sim William, mas ultimamente ele está ainda pior. Parece carregar sobre a sua mente um peso, uma preocupação. Está com cara de cansado.

— Todos nós estamos fadigados da escola e de termos que conciliar a mesma com nosso trabalho durante o dia Rômulo. Vincent deve estar ainda mais preocupado por temer que seu destino seja a rotina de seu pai, ou seja: viver a vida toda copiando chaves, sem tirar a bunda do maldito banquinho do chaveiro.  O único de nós que não parece nem um pouco inquieto para com o futuro é Ivan, já que seu pai já lhe prometeu bancar o curso que ele escolher para a faculdade. O resto de nós depende de alguns milagres, além de muito esforço.

— Bom Will, estou preocupado por que Vincent já sofre e se preocupa demais desde muito cedo, já que nunca teve mãe.

— Sim Rômulo, eu sei disto. Vamos tentar nos concentrar no texto proposto pelo professor para respondermos às questões avaliativas e depois falamos melhor sobre.

William era o tipo de cara que achava que tudo estava sempre normal. A normalidade era admirada por ele. Problemas e soluções eram normais, e se os dois estavam presentes na vida de alguém, era sinal de que esta vida provavelmente estava sendo bem vivida. Mas de que tipo de problemas e soluções estamos falando? Preocupações e despreocupações. O círculo vicioso da normalidade que William tanto admirava. Rômulo já se comportava de maneira totalmente contrária. Era observador. Procurava qualquer sintoma de anormalidade em um mundo normal demais para o seu gosto. Inquietava-se com o silêncio que se estendia por muito tempo, mas também sentia incomodo nas palavras em excesso. A anormalidade era perseguida por Rômulo. Os dois não costumavam cochichar pelas costas de Vincent, já que o mesmo também parecia perseguir a anormalidade, e não acharia muito natural que seus companheiros de classe estendessem uma longa prosa por suas costas.

 O fato de Vincent deixar passar por despercebido este diálogo já evidencia o quanto sua mente estava longe. Para Rômulo, que continuava por perseguir a anormalidade que havia nas ações de seu amigo, isto era de se estranhar. Para William, que adorava ter tudo como natural, isto era propício ao momento que viviam e às características de Vincent. Ousaríamos dizer que a perseguição pela anormalidade em nossas ações é companheira dos amigos mais atentos aos nossos passos, por capricho ou por fruto da boa árvore de uma verdadeira amizade? Rômulo e William podem intrigarmos ainda mais quanto ao caso.

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